sexta-feira, 22 de junho de 2007

Verão traz Sophia de Melo Breyner ao meu jardim

(...) - Ah! - disse o Gladíolo - tenho uma ideia
- Sim? - interrogou o Carvalho.
- Vou dar uma festa!
- Uma festa?
- Sim, uma festa de flores igual às festas das pessoas.
Vou dar uma festa à noite aqui no jardim.
- É uma ideia - disse o Carvalho sem entusiasmo porque estava velho e não gostava de novidades.
- Vai ser maravilhoso! - prometeu o Gladíolo.
(...)
E foi-se dali correndo pelas ruas.
A meio do caminho encontrou o vento.
- Vento - disse ele - tenho pressa. Leva-me à estufa.
E o vento pegou no Gladíolo e levou-o pelo ar até à porta da estufa.
- Empurra a porta - pediu o Gladíolo.
O vento empurrou a porta e o Gladíolo entrou voando na estufa.
E o vento foi-se embora e a porta gemendo fechou-se sozinha.
- O que é isto? - perguntou a Begónia.
- O que aconteceu? - perguntou a Orquídea.
Tenho uma notícia, tenho uma notícia! - gritou o Gladíolo.

E contou-lhes tudo.(...)
Na manhã seguinte, o Gladíolo chamou três borboletas e pediu-lhes que levassem um recado seu à Tulipa, ao Cravo e à Rosa.

- Digam-lhes da minha parte que se está a organizar uma grande festa e que elas fazem parte da Comissão Organizadora e que por isso eu lhes peço para virem esta noite ao jardim do Rapaz de Bronze.
As três borboletas partiram voando a levar o recado, mas pelo caminho foram poisando em muitas flores a quem iam dizendo a notícia. E logo o jardim se encheu dum rumor de conversas e flores. E as borboletas mais tontas do que nunca voavam para todos os lados porque as flores as chamavam e pediam:
- Vem cá. Borboleta. Conta-me.
E as borboletas poisavam, contavam e davam voltas e reviravoltas. Mas por fim chegaram ao seu destino.
(...)
Todos concordaram que a Clareira dos Plátanos era o lugar ideal.
- O terceiro ponto a combinar - disse o Gladíolo - é a orquestra.
- Rãs - pediu a Begónia.
- Cucos e pica-paus - disse o Cravo.
- Rouxinóis - disse a Rosa.
- Melros, moscardos, sapos-tambores - disse o Cravo.
- Creio que o melhor será cantarem todos. Será uma orquestra magnifica e muito co
mpleta - disse o Gladíolo.
A comissão concordou.

(...)

- Esta festa não é uma festa de pessoas, é uma festa de flores - exclamou o Cravo muito zangado.
- Mas numa jarra tem que se pôr qualquer coisa. Uma jarra não pode ficar vazia - respondeu a Tulipa.
- Ah! - disse o Rapaz de Bronze - se as pessoas, nas festas de pessoas põe flores nas jarras, nas festas de flores devem pôr pessoas nas jarras.
- Ah? - disse o Gladíolo.- Temos que pôr uma pessoa na jarra de pedra - concluiu o Rapaz de Bronze.- Mas que pessoa? - perguntou a Rosa.
- Uma pessoa que seja como uma flor - respondeu o Rapaz de Bronze
- Não há nenhuma - disse a Rosa.
- Podia pôr-se a dona da casa - propôs o Gladíolo.
- Não parece uma flor, parece uma corça - disse o Cravo.
- Então o dono - propôs a Begónia.
- Parece um peru. Não serve - disseram os outros.
- E a filha da dona da casa? - perguntou a Orquídea.
- Não, não - disse a Rosa - parece uma rosa de plástico.
- Conheço uma senhora elegantíssima que parece uma Tulipa - disse o Gladíolo - Vi-a ontem na festa. Ficava bem numa jarra. Mas não sei onde ela mora.
- Eu - disse o Rapaz de Bronze - conheço uma pessoa que é como uma flor.
- Quem? - perguntaram as flores.
- A Florinda.
- Bravo, bravo, queremos a Florinda - disseram a Rosa , o Cravo, a Begónia, a Tulipa a Orquídea e o Gladíolo.
Porque todas as flores adoravam a Florinda.
A Florinda tinha sete anos e era filha do jardineiro. Era parecida com todas as flores. Os seus cabelos eram loiros como a cabeleira do Girassol, os seus olhos azuis como duas violetas, as suas mãos brancas e finas como camélias, a sua pele fresca e macia como uma rosa e a sua boca vermelha como uma cravo.
- Estamos todos de acordo e está tudo combinado - concluiu o Gladíolo.
As flores despediram-se do Rapaz de Bronze e afastaram-se rindo e dançando entre o luar e as flores do jardim. (...)"

Excertos in O rapaz de Bronze, de Sophia de Melo Breyner
Fotos by me

2 comentários:

Anónimo disse...

Que belas fotografias InÊs. Também adoro (fotografar) Flores!
E quanto à Sophia, a vénia chega ao chão.

Inês Caridade disse...

Sim, fotografar flores em vasos e na terra. Não mortas em ramos =x