
Estava a apagar mensagens no telemóvel porque a caixa estava cheia, nunca cabem todas. Esta tinha que ficar aqui. Esta fica aqui.
Fotogramas de coisas simples que trago comigo. Coisas que quero agarrar, fechar num globo de neve, e guardar bem para não fugirem.
- Esta festa não é uma festa de pessoas, é uma festa de flores - exclamou o Cravo muito zangado.
- Mas numa jarra tem que se pôr qualquer coisa. Uma jarra não pode ficar vazia - respondeu a Tulipa.
- Ah! - disse o Rapaz de Bronze - se as pessoas, nas festas de pessoas põe flores nas jarras, nas festas de flores devem pôr pessoas nas jarras.
- Ah? - disse o Gladíolo.- Temos que pôr uma pessoa na jarra de pedra - concluiu o Rapaz de Bronze.- Mas que pessoa? - perguntou a Rosa.
- Uma pessoa que seja como uma flor - respondeu o Rapaz de Bronze
- Não há nenhuma - disse a Rosa.
- Podia pôr-se a dona da casa - propôs o Gladíolo.
- Não parece uma flor, parece uma corça - disse o Cravo.
- Então o dono - propôs a Begónia.
- Parece um peru. Não serve - disseram os outros.
- E a filha da dona da casa? - perguntou a Orquídea.
- Não, não - disse a Rosa - parece uma rosa de plástico.
- Conheço uma senhora elegantíssima que parece uma Tulipa - disse o Gladíolo - Vi-a ontem na festa. Ficava bem numa jarra. Mas não sei onde ela mora.
- Eu - disse o Rapaz de Bronze - conheço uma pessoa que é como uma flor.
- Quem? - perguntaram as flores.
- A Florinda.
- Bravo, bravo, queremos a Florinda - disseram a Rosa , o Cravo, a Begónia, a Tulipa a Orquídea e o Gladíolo.
Porque todas as flores adoravam a Florinda.
A Florinda tinha sete anos e era filha do jardineiro. Era parecida com todas as flores. Os seus cabelos eram loiros como a cabeleira do Girassol, os seus olhos azuis como duas violetas, as suas mãos brancas e finas como camélias, a sua pele fresca e macia como uma rosa e a sua boca vermelha como uma cravo.
- Estamos todos de acordo e está tudo combinado - concluiu o Gladíolo.
As flores despediram-se do Rapaz de Bronze e afastaram-se rindo e dançando entre o luar e as flores do jardim. (...)"
ESTUDOS CAMONIANOS
"Estavas linda, Inês, e Camões
decerto não se importará
se eu disser que tinhas
posta no lugar a carne inteira
do meu futuro desassossego.
Aos poucos vai o corpo apodrecendo,
gentil da terra furor de que esquecemos
notícia e lastro, entretidos a morrer
por novas avenidas velhas
que em breve nos não verão mais,
apartados pela vidinha.
Mas estavas tu linda, Inês,
alheia ou talvez nem tanto
ao cego conhecido engano
que por vezes se dissipa
Partida: A menina e moça traz-me o melhor que reuniu entre as suas colinas e num recreio simples, claro e afectuoso leva-me até cada um dos habitantes da terra dos sonhos, de uma forma tão limpa.
Ás vezes deixo-me de perplexidades: há um tipo de qualquer coisa nos quatro elementos que faz com que estas coisas aconteçam, não há? Há não há? Há.
ººº Lista de recados da minha ausência ººº
* Um doce-beijo-à-doce-menina que me deu a mão quando chegávamos a medo.
* Um xi-coração à revelação que apareceu em passos mansinhos e se prepara para ser tanto.
* Miminhos para a pequenita, sorridente e iluminada que aturava todos os meus ataques de insanidade cerebral no Nº13.
* Um beijo na mão ao menino senhor que felizmente se acercou tarde em vez de nunca, que chegou e disse, que aguentou a minha água mole na sua pedra mais ou menos dura e não furou: o meu querido J.C. disfarçado de Clark Kent.
* Um xi e um muah à iluminada: menina do viver o dia-a-dia, companheirinha de festa, esplanada e tudo que é energia.
* Um sorriso a esta linda e cintilante surpresa com ar de rebuçado mesmo agora no fim do início.
* Uma vénia, uma flor e um poema para esta “halface”. Para a pequena bailarina. Pelos momentos em que gatinhamos as duas quase sem conhecer os recantos da cidade. Pelos mesmos gostos. Pelo mesmo sol. Pelos sorrisos. Pelo sonho e pela loucura. Pela simplicidade e autenticidade. Pelas coisas simples.
Para todos e por todos, por tudo que há-de vir.
* Ainda esperamos o Lucas que foi na excursão?
* Deixo-vos uma Carla, uma Rute, um Stephane e um Flávio no frigorífico.
* Levem o meu lixo à reciclagem que me esqueci;
* Mantenham o quarto arrumado!
* Não deixem o espírito do J.Palma morrer.
* Deixo flores que caem das varandas em que passam. Deixo pedacinhos de sorrisos de mim pintados nas paredes. Deixo a saudade. Deixo a memória do que não imaginei que pudesse desde cedo ser assim. Que Lisboa pudesse ser logo assim. Sem vocês não poderia ter sido logo assim.
As nossas vozes que cantam ainda ecoam pela cidade
das pedras que ainda mexem com a nossa dança.
As palavras das conversas trocadas que empurram a tinta das paredes.
O quanto soubemos ser felizes não posso esquecer.
To be continued… ;)
"E que é que foi que ele disse?
E que é que foi que ele disse?
Hoje soube-me a pouco.
passa aí mais um bocadinho
que estou quase a ficar louco
Hoje soube-me a tanto
portanto,
Hoje soube-me a pouco"
Sérgio Godinho
Raval - Barcelona
Isto é uma passadeira. Parem e olhem antes de atravessar.
Dentro deste globo de neve coloquei o cantinho de uma menina que conheci num daqueles encontros de 30 segundos, que tanto se sucedem na minha vida. Um globo onde, quando as purpurinas caem, se vêem paisagens. Um dia agitamos e vemos uma cidadezinha Holandesa Gronningam, outro dia caiu nos pedaços de terra unidos onde passou pelo Colorado, Kansas, Wyoming e Utah. Hoje as purpurinas caem e vemos Xangai. O cantinho da menina do mundo que recolhe pedacinhos curiosos do dia, do dia que lhe foge entre terras e que ela persegue de bicicleta.
Dentro deste globo de neve aqui ao lado está o diário que um pobre menino perdido no mundo deixou cair na cabeça do mago do piano que toca Amélie Poulain. Provocou-lhe danos irreparáveis e agora ele tenta viver entre ele e ele. Um ele que é único e o outro pequenino, perdido em caminhos que são pontos de porquê, entre pedras que são montanhas, entre sombras que falam. Um excelente ‘exorcício’ (fusão da acção de exorcizar com a de exercitar) do lado mau para se ser alguém que é tão de bem com a vida.
Já não amarroto os papeis e deito fora. Há gente que acredita que escrever ensaios a lápis é uma coisa muito séria. Séria: porque sai do coração e merece chegar aos olhos de quem procura o outro lado da coisa. Não séria chata.O coração escreve a lápis.
As coisas podem ser feitas em melopeias e recreios sem esquecer o essencial (o que para nós foi, claro). E se o mais importante da música for a partitura que se parta dela sem medo. Se a tela nos deu para as mãos uma leitura para a vida, que a saibam vocês também. Oiçam o que nos soube bem ver, vejam também o que nos soube mal. Acredito em traçados que sentem assim. E estou feliz por rabiscar ao lado destes grandes brincadores – a sério.
Um dia deram-me um passaporte até a uma fábrica de sonhos. O Charlie foi ver como se fazia o chocolate e eu fui ver um dos sítios onde nasce a “constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer (...) e sempre que o homem sonha o mundo pula e avança, como bola colorida entre as mãos de uma criança.”
Os mestres e os meninos da fábrica mostraram-me como se pode pôr o mundo a pular, como acontecem bolas coloridas, e fizeram-no de forma concreta e definida, para eles era como se fosse outra coisa qualquer.
Mas há sempre o dia em que temos de voltar das viagens maravilha. Nas fábricas encantadas não se pode estar para sempre. Trouxe a mala cheia de vontade, percebi que quando há magia não há limites e que a criação é filha pródiga disso. Já perto da porta abraçaram-me e pediram que voltasse, prometeram-me que os sonhos não iam deixar de ser partilhados comigo. Um dia talvez volte. Entretanto chegou mais uma carta.
Dez horas da manha e o despertador doce que diz que não posso mais repousar nos braços…Oh não! Nos meus braços! Humpf, adormeci mesmo em cima do braço e, como é óbvio, dói-me (até agora).
Ok. Comecemos de novo.
Dez horas da manha e o som doce do despertador diz que não posso mais repousar, 700 crianças “esperam-me” na praça amarela, que assim como a vermelha de Moscovo, Lisboa tem.
- Bom dia, era um Táxi a crédito.
- Qual é o crédito? (ler com voz igual a da senhora que chama o funcionário à caixa central)
Sim, é de aproveitar, porque este tipo de regalias já estão quase a ser, já estão quase a: eram!
No largo caminho até à Praça do Comércio penso sobre a noite passada. O Taxista tenta explicar-me que perto do sítio onde quero ir “dizem que está uma confusãaaao”. (Yah, fixe! Está a ver essa confusão? É mesmo para lá que quero ir, se faz favor). Sou fã dos taxistas desta cidade (tirando o que no outro dia me proporcionou um belo de um acidente). Sou, fã, mas hoje não, quero pensar na noite.
-Tem mesmo a certeza que quer ir para a confusão? Olhe que não se passa.
Encho os pulmões, aperto as mãos, peço perdão antecipado aos duendes, anjos, arcanjos e fadinhas (isto foi de escrever tanto sobre a Floribella) e:
- POOOO…de parar no sítio mais perto, onde lhe dê mais jeito e não lhe cause transtorno, se faz favor.
-E como não há troco a dar. A menina sai e vai a correr.
Sorriso amarelo às pintas rosa.
- Claro. Vah, um bom dia para si.
Rua Augusta. Sol. E o barulho ao fundo, o barulho in confundível dos pequeninos.
Devaneios e esquizofrenias à parte. Tive o tão desejado sol da manhã. Tive sorrisos. Tive alegria. Aquela que só os meus semelhantes conseguem ter. Estavam ali para marchar pelo ambiente. E a minha vontade era de enfiar um boné branco. Desenhar o meu cartaz e andar ali a berrar com eles pelas ruas da baixa por um mundo melhor. Crescemos e nunca mais conseguimos berrar assim.
Caminhei na rua Augusta, pela feirinha de pequenas bancas coloridas onde estavam à venda os brinquedos usados que os pequeninos trouxeram de casa e estavam a vender para conseguir sorrisos numa instituição de solidariedade à sua escolha. Comovi-me (acto que nunca se manifesta em mim) com a sua simplicidade de fazer. O Alberto, um sereno menino, com ar de menino e olhar limpo de menino, explicou-me que estava feliz porque tinham conseguído 123,93 euros para os meninos que estavam doentes. Eu apontava no bloco. E ele perguntou se ia aparecer na televisão.
Seguiu-se a exposição dos trabalhos que tinham feito com materiais usados. Meia dúzia delas estavam perfeitas para coabitar com a minha pessoa. Claro que foram projectadas pelos mais velhos, os professores, mas estava ali o toque mágico dado por mãozinhas.
Tudo feito em "ponto pequeno" para atingir um grande objectivo: o meio ambiente. Afinal é de pequenino que se torce o destino, e o mundo.
Escrevi sobre eles, mas não podia explicar nas folhas do jornal, o que realmente foi importante naquela manhã.
Feliz Dia Mundial do Ambiente!
She has many different zombies
who are deeply in her trance.
She even has a zombie
who was originally from France.
But she knows she has a curse on her,
a curse she cannot win.
For if someone gets
too close to her,
the pins stick farther in.
in "The Melancholy Death of Oyster Boy &Other Stories", Tim Burton